FANTOCHES E MERCENÁRIOS

29-12-2011 19:43

FANTOCHES E MERCENÁRIOS

 

O século XXI inaugura uma nova era de dominação de comando à distância (ou de controle remoto). A dita comunidade internacional impõe uma nova estratégia de controlo das fontes de matéria-prima no mundo. Em África a sua execução é descarada. As antigas potências colonizadoras agora estão coligadas e actuam em uníssono. Manipulam e indicam líderes de sua conveniência para dirigirem as suas antigas colónias. Apadrinham fantoches, aqueles que Mia Couto chama de endinheirados que pedem para guardar carros, que pedem para ficar a guardar o país, enfim que aceitam que a comunidade doadora vá ás compras ou almoçar à vontade para que eles fiquem a tomar conta da nação. Esses doadores e os seus representantes em África, nunca se enganam nas previsões eleitorais. A estabilidade e paz social varia normalmente em função da estratégia económica do chefe máximo no que diz respeito ao escoamento de recursos para o Norte (metrópole). É coisa de romance pensar se o chefe é tirano ou democrático, se respeita ou não os direitos humanos, etc. É o fim da história da humanidade de Francis Fukuyama, que está em vigor. Na Guiné-Bissau, os doadores introduziram, nas últimas eleições, fantoches no poder. Os morticínios na Cosa de Marfim, nas barbas das Nações Unidas, explicam a verdadeira dimensão da arrogância das antigas potências coloniais. O poema de Davidson Abioseh Nicol,  poeta-diplomata serra-leonês ilustra a situação desta forma:

Tu não és um pais, África,

Tu és um conceito...

Tu não és um conceito, África,

Tu és um vislumbre do infinito.

 

Na Guiné-Bissau, as autoridades, sem auscultar o Parlamento, autorizaram a tutelagem angolana do país. Mas, aqui, na Pátria de Cabral, duvido que a moda possa pegar. Não estamos em conflito armado. Guiné-Bissau tem problemas, dizem outros! Problemas, só não os têm quem vive no céu! Gostam de citar os acontecimentos militares de 1 de Abril de 2010. Sobre isso, asseguro-vos que depende de ponto de vista. Se para mim contam os factos. Foi o dia, para mim, em que o Contra-Almirante  Américo Bubo Na Tchuto, se libertou, após noventa dias, do cerco militar na sede da ONU em Bissau, onde se havia refugiado. Já para a coligação de doadores internacionais, a leitura é contrária e especulativa. Para estes, prevalece a versão de atentado contra as instituições democraticamente constituídas, defendida pelo antigo Embaixador da União Europeia, Franco Nulli, concretamente contra a pessoa do Primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior e do ex-CEMGFA, José Zamora Induta.  

O movimento internacional de protecção de fantoches políticos não dá tréguas. A divulgação na sexta-feira, 8 de Abril, do Relatório de Direitos Humanos de 2010, do Departamento norte-americano, atribuindo a morte do antigo Presidente João Bernardo Vieira (Nino Vieira) em 2 de Março de 2009, a soldados sob comandado de António Injai, revela uma estranha incompetência alguma vez escutada e lida por parte da instituição com elevado prestígio mundial. Em direito, procura-se o autor moral, do mandante ou comitente do crime. Mas, não parece ter sido essa a preocupação do referido relatório. No meu ponto de vista, a morte de Nino Vieira teve motivações políticas. Tecnicamente, devia-se procurar o mandante deste acto hediondo. Será António Injai? Será Zamora Induta? Ou será o Primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior? Pergunta-se: quem era, então, António Injai na hierarquia das Forças Armadas da Guiné-Bissau? Não passava de um simples coronel, entre muitos, e comandante do quartel de Mansoa! Quando na tarde do dia 1 de Março, uma bomba explodiu no Estado-Maior, matando o seu chefe, General Batista Tagme Na Waie, alguém assumiu de imediato o comando das forças armadas. Quem? Duvido que esse alguém fosse o coronel António Injai! Nessas horas alguém não perdeu tempo em ordenar envio de tropas para proteger o Primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, tendo-lhe, inclusive, aconselhado a não sair de casa. É sabido que esse alguém era José Zamora Induta.

Quem guardava o país durante esses dias conturbados? Ou melhor: quem devia responder politicamente pelos acontecimentos? Era o Primeiro-ministro! E qual era a sua relação com o malogrado Presidente? Sempre que Carlos Gomes Júnior fosse confrontado com a questão dos assassinatos, barricava-se na retórica da separação de poderes que limita a interferência do poder político na esfera judicial. Recordo que em 10 de Janeiro de 2007, ele próprio, na qualidade de Secretário-Geral do PAIGC, havia-se refugiado na sede das Nações Unidas em Bissau, fugido das polícias que o queriam deter na sequência da polémica motivada pelas acusações de Cadogo Júnior contra Nino Vieira, segundo as quais seria o Chefe de Estado o responsável pelo assassínio do ex-chefe do Estado-Maior da Armada Lamine Sanhá. Bissau, também, sabe que, no dia 2 de Março, logo após a morte do CEMGFA, Tagme Na Waie, a residência do Primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, transformou-se em quartel-general para atingir Nino Vieira, impedindo-o inclusivé de se refugiar na Embaixada de Angola que ficava próxima da casa do Primeiro-ministro, Cadogo Júnior.  Questiona-se, portanto, se o Departamento norte-americano, antes de publicar o relatório, terá ponderado devidamente o momento decisivo em que o Estado-Maior comunicou o Responsável pela Escolta e Segurança do Chefe de Estado, Nino Vieira, Tchipa Na Kudum, anunciando-o a eminência do ataque a sua residência? 

Sobre a presença dos mercenários angolanos no nosso país, lembro que o assunto já foi debatido no artigo anterior, mas mesmo assim continua a merecer a nossa atenção pela gravidade do problema. É uma assombração para todos os guineenses. A indignação é tão grande como na tarde de Março de 2005, quando um helicóptero do exército da Guiné-Conacri pousou altivo no Estádio 24 de Setembro, trazendo Nino Vieira de regresso do exilo em Portugal. Dirão alguns: mas, os tempos são outros! A verdade é que Angola está hoje na vanguarda de um projecto de reforma tribalista idealizado pelo Governo de Carlos Gomes Júnior, nas forças armadas. A história parece repetir-se. Da mesma forma como o Capitão João Teixeira Pinto fora chamado de Benguela, em 1913, para dirigir as campanhas de pacificação contra os povos insubmissos no nosso chão assim foram requisitados hoje os mercenários angolanos para desbravar a sanzala nas nossas forças armadas. Fala-se em ajuda angolana! Como é que uma ideia de generosidade pode ser escoltada por um exército disposto a atirar? É falacioso imaginar a transfiguração do Palace Hotel em quartel-general, como um sinal de candura e paz. Diz o ditado: quem não deve não teme. Esclarece todas as dúvidas o facto do Primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, escolher como seu esconderijo nocturno o quartel-general angolano. Outro sinal de grande cilada montada pelo Governo é o súbito abandono da cooperação militar portuguesa na Guiné-Bissau. Portanto, como se pode ver, os nossos problemas não estão entrincheirados nos quartéis, mas sim nas mentes coloniais dos nossos chefes, que nunca foram capazes de estruturar as nossas forças armadas. Não cansamos, por isso, de chamar a atenção dos guineenses pela necessidade urgente de cortar os laços, desatar os nós, jogar fora os pedaços e transformar esta quadrilha em pó.

 

Por: Balugum