GOVERNO TRANSIÇÃO-PERSPECTIVAS ENCORAJADORAS NO PLANO POLITICO E DIPLOMÁTICO!

21-09-2012 16:40

Eu acho que!

As perspetivas que se avizinham para o nosso País nos planos político e diplomático são tão encorajadoras, que deixam prenunciar, um cada vez maior entendimento entre as diversas forças políticas e sociais, no concernente às questões fundamentais que constituem a agenda do governo de transição para o retorno à ordem constitucional. E isto só se aplica às forças políticas verdadeiramente patrióticas, porque essas, na realidade, são as que contam.

Por isso, a questão central tão propalada, da inclusão no governo de transição da ala do PAIGC de Carlos Gomes Júnior, que ainda divide parte da comunidade internacional, ora defensora das teses da CPLP, ora defensora das teses da CEDEAO, não é negligenciável.

Todavia, não é menos importante denotar que o problema reside essencialmente no seio da família dos independentistas, uma vez que não deixa de ser verdade que o atual elenco governamental, é, em grande parte incorporado por elementos proeminentes dessa organização política, a começar pelo próprio Presidente da República de transição. A não ser que o problema seja resolvido pela assunção do Pacto de Transição pela ala, dita oficial, que os habilitaria a incorporar o governo, pela substituição dos seus camaradas que já lá se encontram.

Repare-se nas leituras para todos os gostos à volta da mesma questão. Ou seja, por um lado, ainda temos parte da ala deposta do PAIGC, a bater na tecla da guerra, com o ainda apoio de Portugal e Cabo Verde, incorporado no Ministro Paulinho das Feiras, a querer impor a tese irrealista da realização da 2.ª Volta das eleições presidenciais;

Por outro, não deixamos de registar a tese muito boba do senhor Mutaboba, e do seu cúmplice de ouvido pequeno, a preconizarem o entendimento à viva força, entre as forças do fórum que suportam o governo, e os aliados de Carlos Gomes Júnior, quando estes, nem querem ouvir falar de outra coisa, que não seja a assunção da liderança do atual processo, vivamente evidenciada nas suas intransigências no bloqueio imposto no parlamento.

De muito bobo, o Mutaboba tem pouco. Infelizmente, não há nenhum registo digno desse nome, relativamente ao comportamento equidistante e produtivo que se lhe esperava no papel de mediação que lhe foi confiado pelo Secretário-geral das Nações Unidas. O povo guineense não tem, pois, que se admirar, com a passividade e cumplicidade, com que este quadro superior do sistema securitário ruandês geriu todo o drama guineense dos últimos dois anos.

Para quem vem de uma desgraça que originou mais de 1.000.000 de mortos na sua terra natal, onde ainda é praxis mandar engavetar e assassinar adversários políticos, não espanta que se tenha limitado a hostilizar e a ostracizar a oposição democrática, no auge da sua luta contra o terror implantado pelo anterior regime, com a atitude irredutível de se pôr ao lado do mesmo.

Também não esquecemos que foram, numa primeira fase, pela negativa, que o atual Representante do Secretário-geral respondia aos pedidos de audiência dos partidos da oposição alegando argumentos falaciosos de falta de institucionalidade destes. E quando, finalmente acedia em recebê-los, fazia-o com gesticulados de escárnio pouco elegantes durante as audiências, os quais, diga-se de passagem, nunca deram em nada.

Mais o mais grave nisto tudo, é o comportamento deste diplomata ao serviço de Carlos Gomes Júnior com as atuais autoridades. Nos mais de 4 meses de implantação do novo regime, o senhor Mutaboba, numa atitude de manifesto desprezo, nunca se dignou chegar à fala com nenhum dos órgãos de soberania, não se coibindo, no entretanto, de ir contra todas as regras de cortesia, ao solicitar encontros com conselheiros do Primeiro-ministro com o pretexto de procurar pistas para a reconciliação entre guineenses.

Porém, não se esqueceu de se precipitar a Lisboa para promover um encontro com o ex-Primeiro-ministro seu amigo e cúmplice. Mediadores destes não nos fazem falta. É urgente exigir a sua substituição.

Aquela coisa que se chama CPLP, que não passa de mais um lenitivo dos sonhadores líricos do Minho a Timor, que até então se tem revelado duma inutilidade a mais não poder, agora deu-se ao trabalho, pela mão dos moçambicanos, de nos arvorar com a bandeira da suspensão.

Mas tal medida, pela parte que nos toca, revela-se, de todo ineficaz e ineficiente. Por isso, em lugar de aplicação de sanções, sugeríamos que avançassem, sem mais demoras, com a hipótese da nossa expulsão, dessa coisa informe, que em jeito de chacota, os brasileiros depreciativamente denominam-na: CPL o Quê?

Que continuem a consumir os dinheiros do erário público em reuniões, conferências e em receções tresandando a regabofe. Pela nossa parte estamos conversados.

Passar bem!

Que fique bem claro, a CPLP não nos interessa. Não temos o menor interesse em pertencer a esse clube de Chefes de Estado, que só poderá contribuir para a nossa desgraça.  

Um outro registo merece a minha atenção.

Numa democracia, a regularidade no exercício dos atos eleitorais, não só é desejável, como também, é incontornável. E, no caso guineense, existem, a meu ver, pressupostos que devem ser observados, sem os quais, o ciclo de instabilidade e violência em que nos encontramos, não cessará a breve trecho.

Lá vamos nós, de novo, num unanimismo avesso, para mais umas eleições gerais, como se as mesmas, representassem, de per si, a solução para todos os nossos males. Não nos enganemos, a realidade é bem outra, o que aliás, é facilmente constatável, se tivermos a paciência de remontarmos à memória do primeiro escrutínio democrático realizado entre nós, nos idos anos de 1994.

Desde então, a experiência tem-nos demonstrado, a fragilidade das nossas instituições face aos enormes desafios que nos colocam as novas realidades. As balizas morais, psicológicas e institucionais ainda não estão suficientemente consolidadas. A própria estrutura social padece de uma reordenação, tarefa para a qual, infelizmente, o partido que tem dominado o poder, não tem, e nem nunca teve vocação.

À sociedade guineense impõe-se uma visão mais estruturante e consensual na procura de soluções. Mais do que aquela que nos é, normalmente oferecida por eleições, sempre rotuladas de livres, transparentes e justas.

Foi um erro muito grande, o facto de se ter admitido que se realizassem eleições, pouco tempo depois do conflito de 1998, como o será, agora, depois deste novo golpe. Em minha opinião, as acentuadas clivagens originadas por estes eventos necessitam de algum timming para que sarem feridas.

É preciso dar tempo ao tempo, de modo a permitir que reine o verdadeiro espírito de reconciliação. Por outro lado, é também necessário que o Estado funcione, de modo a poder cumprir minimamente com as suas obrigações. Para isso teremos que nos acautelar com medidas de rigor e transparência nos atos públicos, de modo a atrair a simpatia e a credibilização externas sobre a bondade dessas medidas. 

O contrário, será exatamente voltarmos ao mesmo, isto é, continuarmos a ter uma classe política completamente estilhaçada, com interesses completamente divergentes, e presumivelmente vários chefes de governo ao longo do mandato e, obviamente, já agora, um Presidente igual ao que saiu, por mais boa vontade que tenha.

Muito se tem especulado sobre as reais intenções da classe castrense sobre o último golpe de estado (e esperemos, mais uma vez, que este seja mesmo, o último), ocorrido, no passado dia 12 de Abril. Mas numa coisa estamos certos e de novo, em total acordo. Era absolutamente necessário e urgente extirpar do panorama político guineense, e de forma radical, a força de bloqueio que constituía a ala do PAIGC do Primeiro-ministro deposto.

Convém lembrar, que não se trata da primeira vez, que a sociedade guineense, se põe a uma só voz, para legitimamente denunciar, num primeiro momento, uma liderança incómoda, para logo a seguir, saudar e aplaudir efusivamente, os que, de uma forma ou outra, ao protagonizarem eventos de mudança, lhe traz a esperança.

Assim aconteceu, com o regime colonial português, no advento da independência, o mesmo aconteceria com o consulado de Luís Cabral, cujo regime apelidar-se-ia, entre outras coisas, de neocolonialismo cabo-verdiano. Nino Vieira, ao derrubar, em finais dos anos oitenta, o regime que inaugurou a libertação do jugo colonial, conseguiria, desta feita uma dupla vitória para os seus desígnios, ou seja, a cisão do partido independentista e uma impressionante e incalculável adesão popular à sua causa.

A fórmula, ao que parecia, era simples. A todos os males, por que padecia o regime, tinha que se encontrar um bode expiatório. Uma vez afastada a ameaça, através de um golpe, nasceria de novo a esperança para os guineenses, cujo futuro nos quase vinte anos seguintes, se reajustaria”, e se reveria no movimento golpista.

O regime ora inaugurado, teve tudo ao seu alcance para promover as reformas necessárias, mormente, a mais importante de todas, e igualmente a mais adiada de todas – a das forças de defesa e de segurança dos antigos combatentes. Porém, o regime preferiu olhar-se a si mesmo e enveredar por outras vias. Foi-se fechando cada vez mais em si, e não tardou em deixar atrás de si, e a pesar sobre os seus ombros a responsabilidade de um grande rasto de sangue.

Apesar de terminado o estado de graça, este regime conheceria um novo fôlego com a onda de democratizações. Mas nem por isso, conseguiu reabilitar-se. Com a nova configuração, os golpistas do 14 de Novembro provaram, não estar à altura de refletir as suas convicções, se é que as tinham, num verdadeiro processo democrático, e enterrar o socialismo “tropicalizado”.

Na esteira das liberalizações política e económica, e com o pretexto da promoção, através da capitalização financeira do empresariado nacional, assistiu-se a um autêntico assalto às instituições, com a cumplicidade tácita do poder. Instalou-se o “facilitismo”, e os primeiros sinais exteriores de riqueza começaram a evidenciar-se, frustrando ainda mais as expectativas das hostes sociais mais frágeis. E como forma de adiar a resolução de fundo dos problemas, o provimento dos cargos públicos passou a reger-se por cotas étnicas, em vez das tradicionais bitolas de produtividade, competência e mérito.

Com a agonia do regime em pano de fundo, generalizou-se um descontentamento e um desconforto de grandes dimensões no seio das forças armadas, que ainda perdura, a que se seguiu uma guerra civil, que, apesar de tudo, viria a desempenhar um papel catalisador na revitalização das esperanças do povo.

Afinal, tudo não passaria de sol de pouca dura. Sem um projeto político e social coerentes, as autoridades que se seguiram, empenhadas que estavam em afirmar-se pela arrogância e um amadorismo inexcedíveis, marcadas essencialmente por um revanchismo sem precedentes, rapidamente sucumbiriam na avalanche das próprias desorientações e desmandos, donde viria a resultar o ciclo atual, que já dura há mais de uma década. 

E agora?

Sem querer profetizar seja o que for, os sinais saídos dos últimos meses, que de resto foram prenhes em acontecimentos elucidativos, mostram o quão repetitivo são os nossos ciclos políticos. Até porque, os atores, de, pelo menos, há quase quarenta anos a esta parte, continuam a ser os mesmos.

É a mesma classe política, que infelizmente, não consegue enxergar para além do seu próprio umbigo, que se livra a intermináveis lutas fratricidas, que não contribui para a solução dos problemas, que aliás, não passou despercebido nas hesitações observadas, durante o período das negociações que culminaram na instituição dos três novos órgãos de soberania de transição.

É a mesma classe castrense, proveniente, na sua maioria, das nossas zonas rurais e verdadeiros detentores do poder real, e ao qual se encontram desesperadamente agarrados, e só a ele agarrados, e que vão ciclicamente sobrevivendo às várias vicissitudes e frustrações desta sociedade. Na ausência de um sério empenhamento, na procura de verdadeiras soluções que se impõem à sua autêntica reforma, são quase que obrigados, também ciclicamente a recorrer a golpes de estado.

Tenham dó! Sejam mais devotos e humildes à causa nacional. E, sobretudo, não se esqueçam das várias matizes que compõem esta nação. Felizmente, elas não se acham todas em Bissau, e muito menos, só nos períodos eleitorais.

Muito Obrigado!

Até daqui a quinze dias!

Victor Pereira

Jornalista

Bissau, 20 de Setembro de 2012